sábado, 25 de abril de 2009

crónica de um tempo impossível # 8 (final)


Assim chegou a Liberdade ao espírito de Margarida. Revoltou-se. Tornou-se senhora de si própria, das suas vontades, em vez de se amarfanhar, medrosa da voz potente do pai, incapaz de desobedecer à mãe, submissa aos irmãos, tal como tinha sido a vida toda. Deixou-os partir em direcção ao seu próprio destino e ficou com Joaquina, decidindo, logo nos primeiros dias, que, em vez de enfrentar os ânimos irados dos trabalhadores da quinta, iria tentar dialogar, negociar com eles o melhor aproveitamento das terras, que revolucionariamente, reivindicaram para si próprios como compensação dos direitos não concedidos durante tantos anos.
De menina protegida pelo internato rigoroso no Colégio de S. Gonçalo, transformou-se em mulher informada, activa, pró-activa e determinada a fazer a diferença. Anulou inflamações partidárias com bom senso, serenou sentimentos reprimidos com justiça, adormeceu friezas com o calor do sentido prático, dividiu, para unir à sua volta, a Vila que a vira romper com o seu próprio casulo.
Todos os dias surgiam novas ideias e, rapidamente, o Solar se transformou em Centro Comunitário, onde todos partilhavam tarefas, haveres e necessidades, e onde Margarida começou a dar aulas aos mais velhos, ajudando-os a aprender a ler e a escrever, a fazer contas de somar e a multiplicar afectos, bem explicados em letrinhas redondas, feitas a lápis, com mãos trémulas de ansiedade por entrar num novo mundo.
Um deles, foi José.
Aluno aplicado, atento, e muito reservado. Aprendeu primeiro do que todos a assinar o nome e a ler as entrelinhas dum futuro próximo, com crescente admiração por Margarida, tendo sido o mais forte impulsionador da sua candidatura às primeiras eleições autárquicas de 12 de Dezembro de 1976, que ela ganhou, quase por unanimidade.
Entre o trabalho e a dedicação à Vila e a Joaquina, a quem os anos já começavam a pesar, Margarida nunca chegou a pensar em casamento. Tornara-se tão livre, que marido algum poderia vir um dia a atalhar-lhe a vontade de realizar os seus próprios desejos, a liderança segura e capaz de mulher completa.
Dois anos depois, recebeu uma carta.
Na caligrafia redonda e perfeita de José, leu as quatro linhas da mensagem:
Já consegui trabalho a poucos quilómetros de Paris. Eu e a Sara devemos casar daqui a dois meses.
Dá beijos à 'Quina.
Nunca vos esqueceremos.
José.

'Quina

20 comentários:

Si disse...

VIZINHANÇA,
Agradeço as colaborações enviadas.
Este foi o final que eu dei a esta história.
Os finais alternativos, serão publicados na íntegra, durante a próxima semana e, como previsto, a surpresa prometida, atribuída no dia 01 de Maio.
Siga a rusga, com os comentários!!

salvoconduto disse...

Porque não podem todas as histórias ser assim? E eu ainda só li parte.

O retrato aqui da Quina é que me deixa intrigado...

1/4 de Fada disse...

Dificilmente poderia ter arranjado um final mais a meu gosto. Sabe que só agora é que reparei que a amiga de infância não voltou a aparecer e não fez falta nenhuma? A Margarida encheu o palco! Está de parabéns, Si. Espero que comemore devidamente o dia de hoje.

Si disse...

Salvo,
Não há intrigas.
A 'Quina não é mais do que uma persaongem inspirada pela minha própria avó, professora primária, que faleceu pouco antes das 1ªas eleições livres de 1975.
Tenho poucas recordações dela, já que era pequena e ela vivia longe, mas há traços - como o sorriso - que podem ser comuns a pessoas de idades semelhantes.
E na minha cabeça, é quase, quase assim, que imagino a 'Quina.

Luis Eme disse...

é uma história com final feliz, Si.

nem todas acabaram assim, como sabemos. mesmo os chamados bons agricultores foram espoliados dos seus bens a favor da reforma agrária.

mas isso acontece em todas as revoluções, Si.

e a nossa de vermelha só teve os cravosm felizmente.

Si disse...

Fada,
Ainda bem que gostou.
Os outros finais também são interessantíssimos, como poderá ler durante a próxima semana.
Beijinhos

Si disse...

Luís,
Obrigada pela atenção a esta história que se baseou em factos puramente fictícios, misturados com acontecimentos da nossa história contemporânea, sobre os quais tentei não me alongar nem conotar com qualquer postura política.
Concordo consigo. O mais fantástico nesta revolução foi, certamente, quase nenhum sangue ter sido derramado.

BlueVelvet disse...

Si,
não era este o meu final, mas gostei.
Tenho algumas reservas quanto a este final tão feliz, mas que pelo menos as histórias sejam de encantar, já que a vida raras vezes é.
Muitos beijinhos de mim para Si

pedro oliveira disse...

O final não é tão feliz na realidade ,mas para quem tem uma mãe "Quina" como eu, melhor final não era possivel.

Violeta disse...

"De menina protegida pelo internato rigoroso no Colégio de S. Gonçalo, transformou-se em mulher informada, activa, pró-activa e determinada a fazer a diferença"
e éd e quem está determianada a fazer a diferença que reza a história.
Bonito post

Patti disse...

Um final que é a sua cara, tal e qual.

Mas há ainda muitas histórias de Abril por terminar; de um lado e de outro.

Gi disse...

É o seu final. Extremamente feliz.
O meu é mais politicamente incorrecto. ;)

De dentro pra fora disse...

Bem...com muita pena minha não participei, o tempo(que é cada vez menos) e a net não ajudaram...quem sabe pra proxima.
Tenho a certeza que encontraste o melhor final para todos , não é!?

Beijinhos e obrigado pelo convite..

ANTONIO SARAMAGO disse...

COMO O COMENTÁRIO NÃO FOI PUBLICADO, VENHO DIZER APENAS QUE COMPREENDO PERFEITAMENTE.

Si disse...

António,
Todos os seus comentários, em posts anteriores, foram publicados, pelo menos os que me chegaram.
O único que recebi, relativamente a este post, foi o que está aqui acima.

ANTONIO SARAMAGO disse...

Peço desculpa, mas fiz um coment. logo pela manhã, então perdeu-se pelo caminho, tenho de fazer outro

ANTONIO SARAMAGO disse...

É uma História de Ficção, o certo é que o que aqui contas, se passou na Realidade com muitas Familias, muitas Propriedades e muita gente ora actuando por Ignorância, ora por incentivos de terceiros.
Já anteriormente me expliquei sobre os maleficios de tal e agora venho só dar-te os parabèns por teres feito um Magnifico trabalho.

Si disse...

António,
Obrigado!
Entretanto, convido-o a ler os outros finais possíveis para esta história que começarão a ser publicados já amanhã.

paulofski disse...

Eu próprio não teria imaginado um final tão interessante e por isso nem me atrevi! Parabéns Si. Obrigado por nos ter permitido ler.

Bjs

pedro oliveira disse...

bom dia,
pelos piores motivos a educação volta à berlinda em porto de mós
http://vilaforte.blogs.sapo.pt/160753.html