quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

desabafo



Já não me bastavam as privações da outra, para me fazer sentir pecadora, gulosa desmedida, depravada compulsiva pelo sabor retemperante de um doce bem doce, com nome de playboy.
Já não me bastava o espelho acusador pelos abusos lambidos na ponta dos dedos e migalhas espalhadas sem culpa.
Já não me bastava o olhar crítico do cadeirão do escritório, a quem proibi os gemidos de aflição.
Estraçalhava eu um Twix Noir - edição limitada - quando recebi um telefonema a avisar-me: já és tia-avó, de um D. Rodrigo de 3,200 kg.

Agora digam-me: com provocações destas, quem é que resiste?

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

assassina de massas


A luta foi titânica.
Enfrentando sozinha um batalhão de centenas de guerreiras armadas até aos dentes, julgou vacilar perante o inusitado confronto. Ainda por cima a uma segunda feira de manhã, meios entorpecidos que ainda estão, os sentidos e os instintos de defesa.
Num primeiro olhar, em volta do seu território, tinha reconhecido a guarda avançada das invasoras, mas desvalorizou; seriam batedores, apenas, peões enviados pelo inimigo, rapidamente esborrachados e repelidos com um estalar de dedos.
Enganou-se.
Do nada, acossadas pela chuva que lhes destruira o âmago do quartel, desataram a brotar em magotes; demonstrando a força hercúlea de levantar várias vezes o seu peso, espalharam-se por todo o lado, trepando, escarafunchando, insinuando-se nos mais recônditos locais e, credo!, obrigando a concluir que de muito pouco serviria uma agigantada figura perante tantos e minúsculos Davides.
Em pânico, sacudiu, partiu para a estalada e o murro esmagador, mas não resistiu e clamou por ajuda, quando descobriu, no centro de comunicações, um núcleo duro de guerreiras entrincheiradas, na guarda da próxima geração!
A mim!, gritou, a mim!, que as comichões já me sobressaltam!
Armado de panos molhados e químicos em pó, o socorro finalmente chegou, pelas mãos da fiel Praça de serviço, que se abateu sobre elas, com a fúria de uma explosão nuclear.
Sobre a secretária, inúmeros corpos inanimados de reticências mexeriquentas sublinharam a culpa: tinha-se tornado numa assassina de massas, mas só assim debelara a maior revolta e invasão de que o seu térreo gabinete se lembrava.
Paz às suas almas...

... de pança cheia com as migalhas dos éclairs Quinta do Paço.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

lista de fim de semana

Mantas, edredões, almofadas, pantufas, aquecimento central, banhos de imersão, sacos de água quente e pijamas fofos.
Pequeno almoço na cama, leite a escaldar, compotas e torradas com manteiga derretida.
Assado no forno, vinho bom e sobremesa doce.
Sesta no sofá, a cabecear para o ombro do lado.
Conversa de chacha, gargalhadas, mimalhices e preguiça aos montes.

Não me esqueço de nada, pois não?

Nunca mais é Sábado!

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

dela o início, meu o final # 2

Era uma vez um conto que começava aqui:

E pronto. Foi esta semana. Entrei em provação alimentar.
Asneiras saborosas, excessos nutritivos e pecados calóricos serão esquecidos durante alguns meses. Deixarão assim de ter lugar no meu prato.
Mas sabem tão bem...o que me custa, sabem lá vocês.
Bom, reza a lenda das dietas, que sempre que alguém decide retomar o saudável caminho da contenção nutritiva, muitos hidratos de carbono sofrem verdadeiros percalços nas suas excessivas vidas.
Soube em tempos de um suculento bife do lombo com ovo a cavalo, ser rejeitado numa mesa durante um almoço de amigos, por se apresentar demasiado gordo. Ora acontece, que nessa mesma tarde o suculento naco, finalmente decidira pedir em casamento a mão da bela sericaia com calda de ameixas. Assim, a sua não admissão à mesa dos convivas revelou-se num real desastre amoroso.
O bife não mais admirou a sua sericaia. Os seus olhares não se trocaram. Os seus pratos nem se roçaram. E os seus aromas sequer se misturaram. Uma tragédia quase fatal, aquela refeição.
Não fora o inestimável préstimo da sua companheira e amiga de tantos anos, a batata frita caseira às rodelas, mais o tinto da casa e a airosa broa de milho, que logo se dispuseram a encontrar solução para o funesto desencontro, jamais os dois amantes se voltariam a refeiçar.
Vai daí, resolveram...

e continua assim:

Vai daí, resolveram acertar talheres e lima-limar arestas que pudessem acidular ainda mais o azedume duma Sericaia desiludida na esperança de encontrar aquele que poderia vir a ser o prato forte dos seus dias futuros.
Desde que ele faltara ao encontro, andava com os azeites; impaciente, irritada, desleixada até, na correcção da tez amarelada por retoques de pó-de-açúcar. E por mais que a tentassem mimar com banhos de hortelã e infusões de flor de amendoeira, a sua doçura inata desaparecera, dando lugar a uma aspereza citrina difícil de engolir, mesmo para aqueles que tão bem lhe queriam.
Os esforços conjuntos dos aliados esboroavam-se em migalhas e, num estado depressivo evidente, a outrora bela Sericaia, definhava e amofava-se.
Foi quando, de repente, surgiu na sua vida o Tecolameco.
Esquivo, finório, tratante e gingão, apaladava-se junto de sericaias inocentes ou encharcadas mal amadas, ganhando-lhes a confiança e fazendo-as sentir autênticos toucinhos do céu, que logo devorava sem complacência.
E ela caíra nas suas garras. Com uma paixão tórrida, caramelada e insana, possuída de gritos gemados de volúpia, sempre que era por ele tocada, ultrapassando largamente, em cada encontro escaldante, a temperatura do seu tão delicado ponto de pérola.
Se outros fossem, encolheriam os ombros e virariam a espátula.
Mas eles tinham prometido, e, assim, a BFC, o TC e a BM, que já tinham praticamente desistido de tentar reunir as vidas e os corações dos seus amigos, acharam estar na altura de proceder a uma intervenção drástica.
Sabendo do seu fraquinho por qualquer rabo de fios de ovos, combinaram com uma sinuosa Lampreia, daquelas profissionais, que se fizesse de frágil e abandonada, junto do Tecolameco, para acicatar o seu espírito volúvel.
Meu dito, meu feito.
Num forno-bar de má fama, o predador Tecolameco bloqueou logo o radar sobre a Lampreia fingida, e os seus avanços lúbricos foram imediatos e impiedosos, sem que se apercebesse minimamente, que todas as manobras do seu cerco iam sendo devidamente registadas pela última geração de câmaras espias, que o isco levava escondida num botão-cereja do vestido amarelo.
Completada a encenação, e quando o pseudo-galã estava plenamente convencido do sucesso de mais uma conquista, preparando-se já para chegar a vias de facto, eis que a Lampreia interrompe a sua exibição preliminar de bíceps, com uma sonora gargalhada e um menear de anca desprezativo, deslizando pelo quarto fora e deixando um Tecolameco seminu, perplexo e incrédulo.
Rodeada dos seus fiéis companheiros, a Sericaia viu o filme todo; quase desmaiava. E de raiva incontida, ingeriu de uma vez só 350 gramas de açúcar, que lhe devolveram finalmente a doçura tradicional.
Daí a o seu coração voltar a bater pelo bife do lombo, foi um instante, a reconhecer a sua fidelidade e firmeza de carácter, um segundo, a escrever-lhe uma mensagem apaixonada, um momento, apenas. Remoçava, renascia e concluía, ela e o seu amado eram confeitos um para o outro e nada, nem ninguém mais os impediria de se refeiçarem, ela de branco véu de claras, ele de tenro fraque, saindo da igreja a cavalo no ovo……
E assim foi, de facto. Com a bênção das freiras Clarissas.
Do Tecolameco, pouco mais se ouviu falar. De quando em vez surge, ali para os lados do Crato, todo trôpego, com um grão de bico na asa, a falar, meio entaramelado, de uma Sericaia Encantada e de uma Lampreia Embruxada que lhe ferveram o coração.
Chegam a ter pena dele, dizem, mas deixam-no ir.
'Conforme fizeres a tua cama, conforme nela te deitarás' - afiançava a minha avó.
E tinha razão.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

thank God is friday!! # 2





O rendez-vous com o Senhor do post abaixo é hoje. Quem não marcou consulta, fica a ver navios...


Bom Fim de Semana!!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

isto não é vírus, é cura

Porque este Senhor é médico.
Se duvidam, vejam o seu regresso no próximo episódio de 'E.R. - Serviço de Urgência', 6ª feira, às 21,45h, no canal AXN.
Aviso: Chiliques não são consideradas urgências no 'County Hospital' de Chicago, mas aceitam-se marcações de consultas na caixa de comentários abaixo.

Patti e Rita Ferro, perceberam?
Blue Velvet, obrigada!

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

o meu belo nariz empinado


Quem diria que este meu narizinho empinado, pousado numa cabeça que refreia a tonta alma sagitária, é uma fonte de inspiração. Aspira sôfrego e expira-se directamente para o papel, formando-lhe nódoas negras, num espirro de letras que se colam como fritos a cartucho.
Portanto, inebrio-me de cheiros. No elevador, no carro, na rua, na gente.
Os do tépido banho Mustela que acalmou a otite febril do bebé do 3º andar, embatem-me nos cílios com o vigor de um piparote no dominó das recordações e de novo tenho nos braços a criança que me cresceu.
Então corro, para agarrar as duas mãos do giroflé-giroflá vertiginoso com a Teresinha, balão no vestido solto, risos de Primavera e golfadas a barrelas de sabão azul que perfumavam as traseiras do quiosque do Sr. Avelino.
Onde se vendia tabaco de cachimbo.
Que dançava no ar, brincalhão, até me seduzir incondicionalmente no plié e pirueta esfumados pelo sopro apreciador do avô Augusto. No colo de quem eu adormecia, exausta do mar de Verão e embevecida pelo aconchego daquele muro de carne e osso, aspergido por colónia 4711.
Do colo de quem eu saía, directamente para a cozinha da meiga avó Joaquina, erva-doce e compotas de abóbora e uva, fervidas aos primeiros odores de Outono, lanchadas no suspiro lambuzado do regresso às aulas.
A porta abre-se e o cheiro húmido e gelado do Inverno entra, rasgando-me o sorriso.
Então, bom dia, até logo e as melhoras do menino.

Post incluído na Fábrica de Letras

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

parasimpattias # 3


Exercício: descrever de forma intensa, a primeira experiência que a memória registou, da cor branca

Avassalou-me logo que abri os olhos para o mundo. Levantei pela primeira vez o sobrolho e inundou-me de serenidade e aconchego, o branco do seio da minha mãe, quando sobre ele me deitaram, acabada de nascer.
Espreguicei, então, os braços e as pernas para me oferecer à vida; tinha uma mente em branco, virgem de imagens, cores, cheiros e sons, páginas e páginas branquejadas, ainda por escrever e destinar. E foi nessa urgência, irrequieta e voluntariosa, que o selo branco da família se me carimbou, dando-me a graça de Branca Alva Branquinho, albicastrense de coração.
Ainda o silêncio enlevado se fazia sentir, quando um berro surdo estremeceu e anunciou que a avidez tomava conta de mim. Em segundos, língua, lábios e gengivas procuraram, encontraram e sugaram, intuitivos, o líquido brancoso jorrado em bica de peitos grávidos de leite e sustento, embranquecendo o colostro a cada sorvo sôfrego e provocando um esgar sorrido nos progenitores; pelas brancúleas dentaduras, adivinhava-se à distância o orgulho desmedido na sua primeira descendência e não eram os únicos: avós, tios e primos rapidamente se juntaram em redor para admirar o novo membro da família. No ar, desfraldou-se a bandeira branca sobre antigas quezílias que deixavam de fazer sentido pelo milagre do nascimento, puxou-se o lustro a laços embaciados e fizeram-se as pazes sob a sensatez que os branquíssimos cabelos da Avó paterna impôs. E pela harmonia reencontrada após tantos anos, assim me transformei no ai jesus de todos, na menina a quem as cambraias branco-anjo futuravam bons auspícios lá pelo meio do branco-névoa do que a vida haveria de ser.
Mas ainda era muito cedo para saber e essas linhas em branco a seu tempo se escreveriam.
Saciada da fome de nascer, permiti que o cansaço me preenchesse, troquei a pálida luz pelo alvacento das pálpebras cerradas e, finalmente, abandonei-me na branquilidade do regaço materno, dormindo um sono solto, enquanto, lá fora, nesse dia 25 de Dezembro de 1967, a brancura do frio caía em flocos imponderáveis.


E porque as memórias têm todas as cores, qual se guardará nas lembranças da Patti?


terça-feira, 5 de janeiro de 2010

sabem que dia é amanhã?

e aqui também.

Exactamente. Amanhã, é a primeira quarta-feira do mês. E do ano também.

Vamos ter muito gosto em receber as vossas visitas e comentários.

Cá vos esperamos. Combinado?

ah, sim, e amanhã também é Dia de Reis, pronto, não me esqueci....

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010