domingo, 5 de abril de 2009

confissões de domingo # 2



Com a Quaresma a chegar ao fim e a Páscoa a bater à porta, pelas mãos de compassos tilintantes, que recolhem proveitos numerários em troca de bençãos e ósculos, sinto uma inevitável força que me puxa para a reflexão, em torno de uma série de conceitos, dogmas, paixões e fés.

Sinto exacerbar-se o meu sentido crítico, para lá do que já se institucionalizou e banalizou criticar, com o aumento de oportunidades de negócio de ramos e folares, mais as compras do supermercado para a refeição familiar de Domingo, exactamente aquele em que se celebra a ressurreição de Cristo, depois de um Calvário sofrido e uma morte torturada e apetece-me repensar nos princípios de tudo.

Nos princípios, em que a compaixão, a caridade, a compreensão e a tolerância eram princípios, a idolatria, o orgulho, a ambição desmedida ou a ostentação de bens, rejeitados pela Palavra de quem, 2009 anos depois, ainda é inspiração de milhões de crentes, mas cuja principal Igreja se encontra tão distantemente colocada destes fundamentos.

E ouço dizer que é a interpretação humana, que tem justificado a versão adoptada pela Igreja Católica dos ensinamentos de Cristo, e que me parece, muito convenientemente, mais virada para a componente material do que para a componente espiritual, para o engrandecimento da estrutura e não para o engrandecimento das almas que a compõem.

Ouço dizer, porque apesar de católica por baptismo, há muito que não pratico os rituais, há muito que nada me dizem as orações decoradas e não sentidas, os cestos passados de mão em mão, as homilias herméticas e, sobretudo, os comportamentos instituídos de perseguição e repressão, da exultação de um Deus castigador e irascível, tão diferentes daqueles exemplos de serenidade, doçura e abnegação que os Escritos revelam.

Retrospectivando, vem-me, inevitavelmente, à memória uma série de exemplos denegridores da imagem dos Homens, sempre eles, que conduziram os destinos da Igreja, apavorados e histéricos para manter as suas posições, esbracejando em todas as direcções para tudo controlar, através de meios de uma eficácia impressionante, como a Santíssima Inquisição, e a hábil utilização do Sacramento da Confissão como primoroso meio de denúncia.

Recordo, a influência no poder legislativo e executivo de países, numa mistura explosiva entre crenças políticas e crenças espirituais, já na Idade Moderna, já na altura em que os hereges e a caça às bruxas tinham passado de moda.

Reflicto, sobre a forma abismalmente diferente em que Homens da mesma profissão de fé, consagram as suas vidas a Deus, escolhendo, uns, cada vez menos, a pobreza e o isolamento dos Mosteiros, outros, a opulência das vestes, dos anéis beijados, dos ventres dilatados, expondo o sucesso obtido na tal profissão escolhida, sempre prontos a apontar o dedo, a recriminar comportamentos e, uma vez mais, a castigar o comum dos mortais, de que eles já não fazem parte, seja com excomunhões, seja com frases.

E pondero, e procuro, e não encontro, um só representante desta Igreja, a mais poderosa do Mundo, que use a sua influência e os infindáveis recursos de que ela dispõe, para lutar corpo a corpo com os podres sociais, em vez de esgrimir argumentos, apoiados em interpretações subjectivas de Palavras santificadas.

E lembro-me dos Missionários. Não daqueles a quem só importa evangelizar, mas dos outros, os que se internam por Infernos adentro, partilhando, ombro a ombro, de mãos vazias, nuas e braços abertos, a verdadeira Caridade perante a Miséria, a verdadeira Abnegação, perante a Doença, a verdadeira Compaixão perante a Guerra, a verdadeira Comunhão com e Submissão a, valores pregados por um Cristo, filho de um Deus Pai, que nos tornou todos Irmãos.

E no fim desta reflexão, apesar de tudo, espero que ela seja, mais uma vez, mais um motivo, nem que seja o único, para a reunião de famílias e para tréguas que ressuscitem a esperança entre os seres humanos.


Boa Páscoa para todos!

17 comentários:

Filoxera disse...

Não sou uma pessoa de fé, mas comungo dos valores da fé católica em muitos aspectos. E acho que devemos pensar menos em nós e mais nos outros, todos.
Beijos.

Pitanga Doce disse...

Esta tradição de "dar uma esmolinha" vê-se dos dois lados.

No domingo em que fui almoçar no tal Clube portugues, quando saí pelo corredor principal vi na parede um nicho onde havia uma grande imagem da Senhora de Fátima. Atrás de mim vinha uma senhora com o marido que reclamou: "não há uma abertura para se deixar uma esmola".
Ainda comentei com a Julinha, "mas a Santa não precisa de dinheiro".

Hoje à tarde levei a Julinha na missa da catequese e ao meio do ato, algumas crianças subiram ao altar com os cestinhos na mão e as pessoas iam lá deixar o dinheiro. Fiquei indignada com aquilo pois a Paróquia é uma das mais caras no Rio, para se fazer um casamento, batizado, ou missas.
Achei que pelo menos na missa das crianças não deveriam usar deste hábito.

boa noite Si

Vera disse...

Si, gostei muito desta reflexão pascal. Sou baptizada e casada pela Igreja. Não baptizei nenhum dos meus quatro filhos, porque não creio que o baptismo lhes traga nada de novo. Não tive educação religiosa, no sentido de que não frequentei catequese, nunca fui frequentadora da missa de domingo. Acredito que os meus Filhos, quando compreenderem, poderão optar e seguir os seus caminhos. Acredito também que para fazer o Bem, para se Amar o próximo, para se construir um Mundo melhor, não é necessário seguir o que a Igreja, cada vez mais longe dos humanos, pretende que se siga. Em mim, tenho Fé. Porque sei tudo o que faço e gosto de fazer pelos outros.
Boa Páscoa Si :)

Miepeee disse...

Uma Boa Pascoa para Si.
Beijinho.

Anónimo disse...

Não me diga que se vai pirar de férias sem se despedir do Rochedo e responder à chamada ad PresidentA!
Boa Páscoa para Si

Ana Narciso disse...

Os homens passam e a Palavra mantém-se ao longo de mais de 2000 anos.Só por esta razão já é um verdadeiro mistério e um verdadeiro milagre. Inspirou e condicionou a nossa forma de estar e de ser, seja ela: a favor, contra, indiferente ou à espera da revelação.E dá-me certezas : estou longe da Santidade e dos Santos. Mas sei qual é o caminho.
Uam Boa Paascoa para si em comunhão com os que mais gosta. Um abraço
da Ana Narciso
Obrigada pelo comentário no Vilaforte. Volte sempre.

Si disse...

Filoxera,
Esse também é o meu pensamento, embora a maior parte das vezes desespere com o egoísmo que impera e que nos dá vontade de 'fazer como os outros'.
Beijinhos

Si disse...

Pitanga,
Eu não me importaria até de pagar o dízimo, se tivesse a certeza que, com o meu contributo, haveria famílias a ter tecto, alimento, medicamentos, ensino ou que quer que lhes fosse mais necessário...
E há tantos a quem ajudar!
Para quê templos imponentes e gente na miséria???
Sou lírica, bem sei, mas enfim....

Si disse...

Vekiki,
A essência do catolicismo não me perturba, pelo contrário, sabendo que mais tarde ou mais cedo, sentiremos sempre a necessidade de nos voltarmos para alguém que nos dê esperança e fé, para além do que os comuns mortais podem fazer.
É a componente humana, os seus vícios e ambições que minam o que poderia ser a esperança e a salvação de povos inteiros.
E isso, não perdoo.

Si disse...

Miepeee,
Ainda nos vamos ver por aqui, mas agradeço imenso os seus votos.
Beijinhos para aí também!

Si disse...

Carlos,
E desde quando há direito a férias nesta altura do ano??
Quem se pira é a PresidentA, que vai colher mais umas pedritas lá na mini-mina de diamantes bébé, enquanto eu por cá tenho que gerir o orçamento fanado, apenas com multas pagas às pinguinhas, como certos condóminos agora resolveram fazer!

Si disse...

Ana,
Foi depois da nossa salutar troca de impressões lá no Vila Forte que quis escrever este post.
Há realmente uma diferença muito grande entre a Palavra (Ben)dita e a Palavra executada. E isso magoa, quando há tanta gente que poderia deixar de sofrer!!
Agradeço e retribuo o votos de Boa Páscoa, bem como o convite para voltar a este canto.

salvoconduto disse...

Sem dúvida, hoje sincronizámos a matéria dos posts e afinámos pelo mesmo diapasão. Por certo celebrarei a páscoa, na sua vertente pagã, a religiosa faz parte de outro peditório...

BlueVelvet disse...

Si,
concordo com tudo o que diz, excepto na minha posição: sou católica praticante, casei por igreja e baptizei os meus filhos.
Como já disse repetidamente em vários vizinhos,a minha Fé tem a ver com Deus e não com o que os homens fizeram com a Sua igreja,
Aliás, tenho uma relação especial com Ele: não Lhe rezo, falo com Ele, e faço-o nos sítios mais estranhos, como na praia, num passeio ou se estou a cozinhar e me dá vontade.
Já estive de relações cortadas com ele 2 anos após a morte da minha avó, tinha eu 18 anos, e ainda hoje, às vezes me zango com ele.
Agora, por exemplo, andamos um bocado de candeias às avessas.
Mas tive a sorte de todos os padres com quem sempre me relacionei serem gente muito especial.
"E lembro-me dos Missionários. Não daqueles a quem só importa evangelizar, mas dos outros, os que se internam por Infernos adentro, partilhando, ombro a ombro, de mãos vazias, nuas e braços abertos, a verdadeira Caridade perante a Miséria, a verdadeira Abnegação, perante a Doença, a verdadeira Compaixão perante a Guerra, a verdadeira Comunhão com e Submissão a, valores pregados por um Cristo, filho de um Deus Pai, que nos tornou todos Irmãos. "
E com este seu parágrafo, termina dizendo, no fundo, tudo aquilo em que acredito.
E a Páscoa, ao contrário do que pensa ou sabe a maioria dos Católicos, é para nós praticantes, uma época muito mais importante que o Natal.
Inclusive, se só pudermos ir à missa e comungar uma vez no ano, então devemos fazê-lo no Domingo de Páscoa e não no Natal.
Beijinhos de mim para Si

ANTONIO SARAMAGO disse...

OLÁ!!!!BOA SEMANA!!!1

pedro oliveira disse...

Tenho um familiar,missionário em Moçambique há mais de 30 anos, que luta pelas coisas mais básicas e contra as doenças, entre elas a SIDA, fazia bem ao "pastor Alemão" ,como é conhecido, passar lá uns dias.

Gi disse...

A Páscoa é, verdadeiramente, o momento mais importante da Igreja.
Era a altura, quando era criança e adolescente, en que me sentia mais próxima dos homens da Igreja.
Quando reflicto sobre os factos que levaram a Páscoa a ser comemorada, sofro, de verdade, por pensar que aquele homem que sofreu por nós todos, poderá ter sofrido em vão.