Há coisas que não se explicam, há coisas que só se sentem, há coisas que nos passam pela cabeça e, por mais que tentemos, não conseguimos exprimir.
É o que me acontece quando penso neste projecto blogosférico em que me meti, nesta empreitada de manter viva parte de mim, que alguém, do outro lado, vai conhecer, interpretar, tirar ilações e concluir, num processo de raciocínio completamente alheio ao que, eventualmente, corresponde à realidade.
Certo, certo, pelo menos, é que abri uma janela para o mundo, onde, todos os dias, vêm espreitar mais curiosos. Uma janela, que, de repente, se transforma num LCD, onde desfilam imagens em forma de letras. Um programa de televisão, em que transmito as palavras do teleponto, certinhas e direitinhas, mas em que a câmara à minha frente, continua, indefinidamente, com o vermelho da luz-piloto aceso, pronta a registar os meus passos, quando retiro o microfone da lapela, orientada por uma série de realizadores, cada um com o seu próprio argumento e a fazer o seu próprio filme.
E depois ainda há os anotadores, os assistentes, os responsáveis pela iluminação, os carpinteiros de cenários, que se põem de lado a assistir, sem interferir, tirando os seus apontamentos, prontos a chamar a atenção se houver algum erro de raccord, na evolução da história que contam sobre mim.
Verdade ou mentira, certeza ou imaginação, afirmação ou negação, tudo o que por aqui deixo, se submete ainda às mãos de outros tantos maquilhadores e figurinistas, que carregam mais ou menos nas tintas com que me pintam, e me ajustam ou tornam lassas as roupas de personalidades com que me vestem, num pantone de tons, de acordo com as suas preferências, sendo possível que me atribuam papéis tão diferentes como o de uma delicada sufragista espartilhada, uma máscula atleta de triatlo ou uma extraterrestre de olhos em bico e mãos deformadas de tanto dedilhar o teclado.
E o que sou realmente? Talvez tudo o que pensam de mim, talvez nada do que alguém alguma vez pensou, na certeza, porém, de que ser o que sou nem sempre é ser a mesma coisa...
Até Domingo, querido Diário!
Beijinhos,
Si
14 comentários:
Manter um diário é complicado porque nos leva a fazer perguntas a que nem sempre queremos responder. Ao ler o seu post de hoje, surgiram-me tantas que nem imagina.
Beijinhos e bom domingo.
Essa é uma das coisas fascinantes deste mundo virtual. Esta nossa identidade virtual, tantas vezes diferente da identidade real que por detrás dela se esconde, é percepcionada aqui independentemente daquilo que somos na realidade, independentemente da idade, profissão, aspecto físico, etc.
Fico à espera das próximas linhas do teleponto.
É claro que ser o que é nem sempre é a mesma coisa, mas apesar de todos os intervenientes no processo há sempre uma boa parte de nós mesmos que consegue passar para aqui.
A não ser que se use uma máscara permanentemente.
E não acredito que seja o caso aqui.
Muitos beijinhos e bom domingo
Para mim, tudo o que deixa escrito é a Si na sua plenitude, por que o que a Si é e todos nós, no dia-a-dia não deixa de ser a represnetação do que somos e daquilo que querem de nós.
Beijinho
cantinho da casa (sol no blogspot)
Fada,
Apesar de me colocar estas questões, não me preocupo muito com as respostas.
Estar na blogosfera é um acto de vontade própria que só deve continuar enquanto nos dá prazer.
Caso contrário, não tem sentido.
Beijinhos
Devaneante,
Não sei se será bem assim.
Poderia ser, se a postura na blogosfera fosse apenas e só deixar escritos sobre variados temas à nossa escolha, reais ou ficcionais.
Mas isso não é um blog, é 1 jornal ou 1 livro on-line.
Num blog, escrevemos e somos comentados, respondemos aos comentários e comentamos nos espaços de outros.
Quer queiramos quer não, a nossa identidade real está sempre em causa.
Obrigado pelas visitas.
Velvet,
Claro que sim. A câmara está sempre ligada e os juízos de valor vão construindo imagens de cada um de nós.
As máscaras não duram muito, mas as almas só se vêem com os olhos de verdade.
Beijinhos
Sol no Cantinho da Casa : ),
Foi essa a imagem que criou de mim, por aquilo que lê, daquilo que eu escrevo, e que naquele momento saiu assim.
Haverá quem concorde, haverá quem discorde.
Mesmo na vida real as pessoas não são unânimes naquilo que pensam e nós.
Beijinhos
Concordo consigo, mas apenas em parte. Afinal nunca revelamos tanto da nossa identidade real aqui neste mundo virtual quanto revelamos aos nossos amigos reais. E há muitas coisas que nunca revelamos...
Tenho o esqueleto de um conto meio "alinhavado", para colocar no meu cantinho, que aborda esse tema. A seu tempo chegará...
Já agora, as minhas visitas não carecem de agradecimentos. Faço-as não por cortesia, mas porque gosto do que por cá encontro :-)
Na blogosfera, como na vida real, há quem pretenda saber bem mais do que nós próprios.
São uns visionários, uns iluminados.
Na blogosfera, ao invés da vida real, tudo é absolutamente permitido, dissolutamente, indessoluvelmente.
Eu sou dos que dizem quase nada. Há uma grande diferença entre o falar e o escrever, entre o dizer e o contar. Gosto de pensar no que quero expressar, e a escrita dá-me tempo para reflectir e sentir, me fazer entender sem improvisar. Como se faz um filme e não um programa em directo.
Paulofski,
Mesmo os programas em directo têm alinhamentos rigorosos e até efeitos especiais, se fôr preciso.
Mas nós não dizemos apenas aquilo que escrevemos nos nossos posts, dizemos também aquilo que respondemos nos comentários ou comentamos nos blogs dos outros. E é aí que a 'câmara' nos continua a seguir, ou se quiser, é aí que todos os vizinhos de cada casa do bairro nos continuam a seguir os passos, ouvindo cada conversa, cada opinião, cada gargalhada ou cada grito que damos.
Por isso acredite: isso diz muito mais de nós do que alguma vez pensámos, sabendo que cada cabeça tecerá uma sentença diferente sobre a nossa personalidade, consoante a sua própria e livre interpretação....
Não devia ter lido este post a esta hora da noite. Foi bem feito, porque andei a folgar durante 3 dias e deixei as leituras atrasadas. Agora que este post me deixou com a cabeça a fervilhar de perguntas a que não quero agora responder, não tenha dúvida. Na próxima semana tenho de chegar mais cedo.
conchinhas
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