sábado, 28 de fevereiro de 2009

Adverti(Si)ng # 9


.......e livro de instruções, já agora.........



BOM FIM DE SEMANA!!






sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

no gabinete # 2


Depois da postura fracturante, longitudinal e intra-cúspides que o Partido Pré-Molar da ala esquerda revelou, o Gabinete, em congresso, viu-se forçado a tomar medidas extremas, procedendo à sua expulsão definitiva e rematando o assunto com vários pontos finais.



(ou: a proeza fantástica de conseguir chegar ao diagnóstico de uma fractura pré-existente e invisível ao rx, desvitalizar uma raíz já morta e finalmente extrair o 1º dente da minha vida!!!)

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

conversas secretas # 2



Sentou-se um bocado a descansar. Sentia-se ofegante e com os pulmões a arder. Ficou ali, sózinha e pensativa, um bom par de horas, tentanto recobrar o ritmo normal, mas estava exausta.
Sem que o tivesse pressentido, Création aproximou-se, devagar, intimidado pelo seu desmedido tamanho e contraditória fragilidade.
- Que tens tu? - perguntou ele a medo
- Falta-me o ar, falta-me o verde, falta-me o azul e falta-me o transparente das minhas águas.
- Perdeste-os, foi?
- Sim, quase todos. E os que restaram, estão tão revoltos dentro de mim, que me abrandam a marcha na minha volta de todos os dias.
- E lembras-te onde os deixaste? Queres que te ajude a procurar?
- Eu não me esqueci deles em lugar nenhum. Deixei foi que mos tirassem...
- Não importa, eu ajudo-te na mesma. Diz-me quem tos tirou, que eu vou lá para obrigá-lo a devolver o que era teu. Faz-te muita falta, não faz?
Embora fraca, conseguiu sorrir com a pureza e a inocência do raciocínio do seu interlocutor.
- Deixa, não vale a pena. Só vão dar valor ao que me tiraram quando perceberem a falta que lhes faz. Chama-se a isso aprender, arcar com as responsabilidades dos actos que se cometeram. Anda, faz-me companhia enquanto descanso. Diz-me lá como é que te chamas?
- Création, e tu?
- Chama-me o que quiseres: Mundo, Terra, Mãe, Filha Terceira do Sol, ou até podes inventar um de que gostes, é como tu preferires.
- Se és Mãe, posso ser teu filho?
- Podes - respondeu quase a rir.
- Está bem. Então vou-te chamar Mãe-Terra do meu Mundo. E não te preocupes. Agora que já inventei o teu nome, vou inventar uma forma de te proteger.
- Ai sim? E como? - perguntou-lhe, enquanto lhe afagava os caracóis fartos e loiros.
- É fácil. De cada vez que te tentarem tirar algum do teu ar, do teu verde, do teu azul ou da transparência das tuas águas, eu visto-me com os fatos do Vento Norte, ponho na cara a máscara, ora do fogo, ora da chuva, ora da tempestade, ora do sismo e desato a correr para eles. Vais ver como se assustam!
- Huuum.... és capaz de ter razão; se calhar tenho sido muito branda, mas tu? Tu és tão pequeno, não vais ter força para isso tudo...
- Vou sim. E não sou pequeno, eu já sou grande, cresci agora mesmo com o nome com que fiquei: Création Mãe-Terra do Meu Mundo Neto Terceiro do Sol Vento Norte Fogo Chuva Tempestade e Sismo. Com este nome, vou ser capaz de tudo, só preciso de agarrar a tua mão, como as Mães fazem com os Filhos e como os Filhos fazem com as Mães.
Ela deu-lhe a mão, comovida.
Levantaram-se e, juntos, inciaram mais uma caminhada à volta do Sol Pai Avô.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

para bem, para bem,


era hoje estar aqui, a ver isto, ao vivo...





...a usar esta fabulosa máscara...
que havia de trazer para casa, para nunca me esquecer dum Carnaval assim.

Ora digam lá se também não iam???

sábado, 21 de fevereiro de 2009

é carnaval, ninguém leva a mal



BOM FIM DE SEMANA!!

BOM CARNAVAL!!!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

conto de história




Esta é uma história antiga, muito antiga, daquelas tão antigas que nem sabemos ao certo quando se passou. Tem para lá de cinco mil anos e aconteceu a milhares de quilómetros daqui, na China milenar, governada por um imperador chamado Shen Nung, o patricarca da etnia Han. Um homem estudioso e iluminado que acreditava que o conhecimento e a disciplina beneficiariam e incentivariam o seu povo a cuidar da saúde e do seu bem estar, um herbalista documentado, que viria a tornar-se pai da Terapia Oriental. Rígido nas suas convicções, uma das primeiras medidas que tomou, foi a de obrigar todos os seus súbditos a ferver a água destinada a beber, porque acreditava que isso os aproximaria da pureza.
Grande parte do seu tempo dedicou-o a percorrer o país de lés a lés, andando pelo meio dos campos e das culturas, observando os agricultores e dormindo na terra. Foi assim que Shen Nung recolheu a maioria das espécies vegetais conhecidas da altura, provando-as e estudando as suas propriedades medicinais e foi assim que, numa dessas incursões, algo de extraordinário aconteceu.
Descansava debaixo de uma árvore, quando um dos servos lhe trouxe, acabada de ferver, água para matar a sede da caminhada. Antes que a levasse aos lábios, umas folhas caíram-lhe em cima, tingindo-a de verde e dissolvendo-se num paladar soberbo. Maravilhado, ali mesmo Shen Nung a provou e aprovou, decidindo que passasse a ser servida no palácio, e que a Camellia sinensis fosse largamente introduzida na produção agrícola chinesa.
Sobre ela, muitos séculos mais tarde, Lu Yu haveria de escrever um livro, intitulado Ch'a Ching, onde documentou, exaustivamente, o cultivo e preparação do chá chinês, que haveria de correr mundo, levado pelos portugueses, e tornar-se na bebida mais consumida de sempre, a seguir à água. **
Abri-vos o apetite? Então entrem, sentem-se e sirvam-se. O bule já está na mesa.


e se houver alguém, neste bairro, viciado em chá, considere-se, hoje, convidada especial...

**Nota Si: esta história, na sua essência, contém factos verídicos e outros que fazem parte da mitologia chinesa.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

regresso anunciado

Depois do solstício de inverno, lá do outro lado do mundo, era tempo de começar a arrumar a casa, preparando-a para os meses de ausência. Saía tudo de dentro das gavetas encastradas, sacudia-se, esticava-se, cada fibra no seu lugar, rémiges e rectrices desempoeiradas e cuidadosamente aspiradas de ácaros e bichezas semelhantes, para se voltarem a guardar, meticulosamente alinhadas.
Metia-se o bico em tudo o que era canto, certificando-se que o lar ficava devidamente arejado e ventilado e, no entanto, hermético às humidades e ventanias monçãs, que enchessem o vazio de quem ali mora apenas metade do ano e faziam-se reparações de última hora, que reforçavam o eterno desejo de voltar, assentando mais um naco de barro, mais um toro, do tamanho e grossura de um palito. Sempre atarefada, de um lado para o outro, irritava-se com o companheiro de toda a vida, que, fora e dentro, dentro e fora, arrastava com ele lixeira para onde acabara de limpar.
Chriiiiurirrrriurrirriu, admoestava-o ela, irritada.
Chrrrriurruiuuuiiirrrrriii, respondia-lhe ele, enfadado.
Chrrrruriiiiirrrrrriu, chrrrriiiirrriuuirrrriirrii, alterou-se em tom mais alto e logo ele se arrependeu, chriirrruiu, chrrriu, chrriiiiiii, desculpando-se, meigamente, com o nervosismo da viagem.
Malas aviadas, casa arrumada, ontem, partiram os dois de asas dadas, lá dos confins de África. Devem chegar para o mês que vem, onde eu os espero, com a chave da casa de cá, que me pediram para guardar nos últimos dias do Verão passado.


Por cima da porta principal da entrada do meu escritório, existe, desde há 4 anos, um ninho de andorinhas, semelhante ao da foto, para onde, todas as Primaveras, o mesmo par regressa, põe os seus ovos e cria os seus, quase sempre, 4 filhotes, que vemos crescer e aprender a voar, num ciclo de renovação da Natureza, maravilhoso de se assistir.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

patchwork


Nas linhas brancas dos alinhavos, revia as prioridades da sua vida. A espaços regulares e muito direitos, esboçava os passos que dava em cada dia, primeiro com o giz, à laia de ensaio, depois com a tesoura que lhe definia os limites, a seguir com a agulha, que lhe juntava provisoriamente avessos e enviuzados para ver se se entendiam, e, só no fim, com a máquina de pedal, que casava definitivamente as decisões do figurino em ligar fazendas, entretelas, fitas de nastro, forros de cetim e ombreiras.
Jacinto era, portanto, um homem pacato e ponderado, filho único do único alfaiate dos Pousos, aldeia onde nascera 56 anos antes. Do pai, herdara a profissão e a loja, da mãe, o feitio à medida de qualquer moça casadoira que se quisesse perder naqueles olhos castanhos avelã, iguais aos galões que pregava nos fatos de linho.
Mas os anos foram passando, e nenhuma quis coser a sua vida à dele, nem ele nunca se encantou com os modelos da terra, julgados e bem medidos pela bitola que tinha dentro da cabeça. Os pais desapareceram e ele ficou, sózinho, fielmente unido às costuras da clientela.
Por alturas do Outono, precisamente quando o caixeiro-viajante andava numa lufa-lufa, no leva e traz das novidades da estação, chegou-lhe aos ouvidos que iria chegar, em breve, a filha emigrada dos donos da retrosaria, que tinha abalado para França logo em menininha. Recordava-se, muito vagamente, de uma cachopa de tranças bem apertadas em dois grandes laçarotes de cetim rosado, chuleado à mão nas pontas, para não desfiar, e do rosto, só conservava a imagem de dois botões negros e grandes, forrados com pestanas espessas.
Foi, por isso, com surpresa, que numa quinta-feira à tarde, viu passar uma figura alta, dentro de um vestido de algodão lilás, primorosamente debruado a nastro de florinhas minúsculas, decote quadrado e manga três quartos. As pinças do corpete, perfeitamente alinhadas com o encaixe do peito generoso, sobressaíam elegância, e a saia rodada, em godés de guarda-chuva, tinha a baínha logo abaixo do joelho, para deixar à mostra a medida certa de umas pernas encamisadas numas meias de seda transparente e sapatos a condizer.
Quase em câmara lenta, desfilou defronte da sua loja, com um sorriso estampado na cara, em contraponto ao recorte liso de um par de lábios aveludados, estacou à porta e deixou sair um gritinho de alegria. Jacintô!!, exclamou, estás na mesma!! Não te lembrras de mim?? Sou a Suzete, crriatura, o que eu chorrei por toi, quando me fui, chérrri!!
Naquele momento, Jacinto sentiu-se como que picado por milhares de alfinetes, atordoado como se o ferro de engomar lhe tivesse caído em cima da cabeça! Como pudera esquecer? Como pudera não lembrar a carteira de escola atrás da dela, e o que ele apreciava o ponto cheio das letras 'S.M.' bordadas no seu bibe? Suzete Marrazes....há quanto tempo!!!
Rapidamente, ela pô-lo a par da sua vida, como modista de luxo das Madames em Paris, pondo em prática o que aprendera na Mestra que a acolheu à chegada de Portugal. Falou-lhe da riqueza dos tecidos, das cores que lhe traziam do estrangeiro, das linhas de seda, das máquinas de corte que inaugurara no novo atelier, de tudo, tudo e também das saudades que lhe ficaram no peito ao despedir-se dos Pousos. Voltava para ficar, queria assentar os vincos da sua existência.
Escusado será dizer, que não tardou muito a que Jacinto e Suzete juntassem os trapinhos e unissem as suas vidas, afinal, eram um para o outro como colchetes e nunca mais se desapertaram, caminhando lado a lado pelas pregas da vida em felicidade reforçada em cada ponto.

Perguntei-lhes como quereriam que terminasse de contar a sua história.

Foi-me dito que lhe desse um fecho de correr.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

energias



Ver a vida por um fio e sentir os choques que este nos provoca, será, talvez, a única oportunidade que temos para inverter as polaridades

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

às (Si)gundas-feiras...# 4



A crise toca a todos......


FAÇAM O FAVOR DE TER UMA BOA SEMANA, SIM???


sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

amores de perdição


Dá-me um whisky.
Mau...
Anda, deixa-te lá de conversas e serve-me que é para isso que aqui estás!
Serviu-a.
Bebeu, de um trago.
Pousou o copo e atirou as moedas para cima do balcão. Virou as costas e equilibrou-se de novo nos saltos que lhe torturavam os pés, lembrando-lhe a vida passada a percorrer as esquinas, a responder a uns e a outros quanto é que valia a sua vida.
Atendeu o telemóvel, para dar conta de que já estava ao serviço. Sempre à mesma hora; só lhe faltava picar o ponto e vestir uma bata de trabalho, que sempre daria jeito para tapar o corpo do gelo que fazia na rua, naquela noite de Fevereiro.
Uns metros mais à frente ficava a sua zona, conquistada com suor, esforço e algumas escaramuças e estalos bem dados à concorrência. Olhou em volta, acendeu um cigarro e esperou, numa pose a favorecer a mercadoria. A loja estava aberta, só faltavam os clientes.
Foi já depois das cinco e meia da manhã que se começou a preparar para sair; sair, para entrar, na pensão onde vivia com o 'Gêncio. No bolso, levava o pequeno rolo de notas, os proveitos da noite, que já tinha conferido e separado das gorjetas; poucas, porque os clientes já não se esticavam muito na generosidade, mas ainda assim, só dela, como dela era a boca que se deixava beijar, o corpo que se deixava tocar, imune às promessas que ouvia em momentos de delírio.
Subiu as escadas já sem sapatos, meteu a chave na porta, estendeu-se na cama do quarto alugado e sentiu outro corpo que se aproximou do seu, a pedir mais um tempo de aluguer.
Nem sabe se o concedeu ou não.
Nem lhe importa.
Era apenas mais um dos amores da sua perdição.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

ao correr da pena


nem sempre ao escrever tenho pressa

de acabar o que escrevo depressa

será antes urgência que desimpeça

de saber o fim do que se começa

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

encontros


Apertou o espartilho ao máximo, agarrada à coluna do dossel, esvaziando os pulmões para dar o jeito final às fitas de nastro corridas pelos ilhós e abandonando-se à força com que a criada de dentro as puxava. Subiu as perneiras das coulottes, para desenrolar as meias de vidro, que prendeu com a liga e enfiou os pés delicados nos sapatinhos de biqueira redonda. Compôs as mangas de balão da camisinha interior, ajeitou os saiotes engomados e enfiou-se no vestido de tecido adamascado azul petróleo que lhe vincava a cintura e redesenhava o colo do seio branco. Sentada na banqueta da cómoda espelhada, Luísa admirou o seu reflexo, retocou a face com o fino pó de arroz e no final perfumou-se, espalhando nos pulsos e atrás das orelhas a essência de rosas.
Escolheu com cuidado o alfinete com que ia pregar o chapéu, pegando nuns e noutros antes de se decidir. Uma pedra turquesa, com umas leves penas de pavão seriam o remate perfeito para a toilette dessa tarde.
Antes de descer, releu uma vez mais o bilhete, mandou chamar a charrette e, ainda no quarto, encaixou no penteado a capeline, dando uma última vista de olhos no espelho, satisfeita com o resultado.
Chegou ao local, com 10 minutos de atraso, onde ele a esperava, já impaciente, andando de um lado para o outro com o relógio de bolso na mão. Cumprimentou-a com um leve acenar de cabeça e a intenção de levantar, com uma das mãos, o panamá que lhe cobria o cabelo perfeitamente domado a brilhantina, enquanto que a outra pegava na dela, levando-a até aos lábios sem tocar.
Sentaram-se na manta estendida pelo cocheiro, em cima das ervas rasas que ladeavam o rio e ali ficaram, até ao anoitecer, numa conversa amena, numa troca de olhares púdicos, com laivos de insinuações carnais que ele via em cada mordisco que ela dava nas queijadas do farnel.
Já em casa, Luísa tomou um duche rápido, passando a água na cara por mais do que uma vez. Enrolou-se numa toalha seca e enxaguou o cabelo com massagens enérgicas, atirando-o para trás num movimento solto e examinou a pele clara, acabada de esfoliar. Pegou no creme hidratante, espalhou-o uniformemente e, pelo caminho até ao quarto, deixou cair a toalha ao chão. O espelho alto devolvia-lhe a imagem de uma mulher elegante, de carnes firmes, seios rosados e cintura estreita, perfeitamente definida dentro das camisolas de lycra colorida, jeans justos e elásticos, enfiados por dentro de botas de cano alto e biqueira redonda.
Espalhou um pouco de fond-de-teint naturel, sublinhou a pálpebra de cima com um eye liner fino, esticou e avolumou as pestanas com rimmel, passou um pouco de gloss nos lábios carnudos e por fim borrifou generosamente a roupa com o último perfume da Dior. Sacudiu uma vez mais os cabelos que deixara secar ao ar, depois de uma boa dose de mousse para caracóis, e confirmou as horas no telemóvel. Saiu apressadamente, descendo as escadas três a três, voando para dentro do Clio de dois lugares e iniciando a marcha com um chiar de pneus. No semáforo vermelho, aproveitou para acender um cigarro e pensar no encontro marcado. 'Que cena marada em que se metera', disparou, sorrindo para o retrovisor.

Onde é que já se viu ir ao encontro de alguém desconhecido, só porque recebera um enorme bouquet de rosas vermelhas passion, com um bilhete manuscrito em letras inclinadas, dizendo: 'Adoro-a desde o primeiro momento em que a vi. Espero por si, hoje, às 17.00h, na curva larga do Rio Prateado'


Republicação, para desafio de Julho da Fábrica de Letras

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

no gabinete





Já andava há algum tempo com umas insinuações altamente desagradáveis, espetadela aqui, alfinetada acolá, num jogo de esconde-esconde de moer a paciência a qualquer um.
Como qualquer bom dissimulador de comportamentos, arreganhava-se no sorriso, sempre que o enfrentavam, para logo se vingar, causando mais algumas horas de um ambiente carregado de mau estar.
Que gozo imenso lhe dava provocar dúvidas e interrogações entre os colegas de trabalho da sua secção, despoletando investigações internas, por agentes externos, deixando todos a perguntar entre si 'mas afinal és tu?? ou é ele? ou será que serei eu??'
Manhoso, o que ele se ria de todos, ao tirar-lhes o descanso nocturno, exibindo uma inocência perfeita, sem arredar um milímetro do seu posto, não fosse a desconfiança geral cair-lhe em cima.
Insidioso, gostava, particularmente, de lançar suspeitas sobre aquele colega mais novo, o contratado a prazo, aquele que toda a gente sabia que tinha uma função, no mínimo, discutível e estava nítidamente deslocado, com todos os agentes de investigação externa de olho nele, pronto a pô-lo na rua, sem apelo nem agravo, ao mínimo derrapanço.
O desespero começou a instalar-se, com os relatórios que iam sendo fornecidos, mas, como não sou mulher de meias tintas e já lhe tinha feito a radiografia, apontei-lhe as baterias todas, num braço de ferro que ou ia ou rachava!
Chamei o investigador externo-chefe, que lhe entrou pelo gabinete adentro, sem pedir licença, o revistou de cima abaixo e lhe desatarrachou as defesas até à raíz do problema, até àquele podre da sua existência, que ele trazia tão bem escondido, que pensava ser impossível alguém descobrir.
Ainda deu alguma luta, tentando negar as evidências, mas a prova ficou à vista de todos. Não teve outro remédio senão render-se envergonhado e ser expulso do seu próprio gabinete, para sempre.
Finalmente descansei.
O pré-molar desvitalizou-se e o siso, afinal, era inocente.


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

olhos nos olhos



olhos nos olhos, que tão bem conheço

cúmplices de histórias por inventar

sinceros e sérios como eu te peço

em mais do que um tempo do verbo amar



domingo, 8 de fevereiro de 2009

ponto de (Si)tuação # 17



Querido Diário,

Há coisas que não se explicam, há coisas que só se sentem, há coisas que nos passam pela cabeça e, por mais que tentemos, não conseguimos exprimir.

É o que me acontece quando penso neste projecto blogosférico em que me meti, nesta empreitada de manter viva parte de mim, que alguém, do outro lado, vai conhecer, interpretar, tirar ilações e concluir, num processo de raciocínio completamente alheio ao que, eventualmente, corresponde à realidade.

Certo, certo, pelo menos, é que abri uma janela para o mundo, onde, todos os dias, vêm espreitar mais curiosos. Uma janela, que, de repente, se transforma num LCD, onde desfilam imagens em forma de letras. Um programa de televisão, em que transmito as palavras do teleponto, certinhas e direitinhas, mas em que a câmara à minha frente, continua, indefinidamente, com o vermelho da luz-piloto aceso, pronta a registar os meus passos, quando retiro o microfone da lapela, orientada por uma série de realizadores, cada um com o seu próprio argumento e a fazer o seu próprio filme.

E depois ainda há os anotadores, os assistentes, os responsáveis pela iluminação, os carpinteiros de cenários, que se põem de lado a assistir, sem interferir, tirando os seus apontamentos, prontos a chamar a atenção se houver algum erro de raccord, na evolução da história que contam sobre mim.

Verdade ou mentira, certeza ou imaginação, afirmação ou negação, tudo o que por aqui deixo, se submete ainda às mãos de outros tantos maquilhadores e figurinistas, que carregam mais ou menos nas tintas com que me pintam, e me ajustam ou tornam lassas as roupas de personalidades com que me vestem, num pantone de tons, de acordo com as suas preferências, sendo possível que me atribuam papéis tão diferentes como o de uma delicada sufragista espartilhada, uma máscula atleta de triatlo ou uma extraterrestre de olhos em bico e mãos deformadas de tanto dedilhar o teclado.

E o que sou realmente? Talvez tudo o que pensam de mim, talvez nada do que alguém alguma vez pensou, na certeza, porém, de que ser o que sou nem sempre é ser a mesma coisa...

Até Domingo, querido Diário!

Beijinhos,

Si

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Adverti(Si)ng # 8

'Que diferença da mulher o homem tem?

espera aí que eu vou dizer, meu bem....'

BOM FIM DE SEMANA!!!

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

em tempo de crise

Fernando Pessoa
(Lisboa, 13 de Junho de 1888 - Lisboa, 30 de Novembro de 1935)

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá a falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver
apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas
e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si,
mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma .
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.É ter coragem para ouvir um 'não'.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?

Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

(Fernando Pessoa)


Nota: Fernando Pessoa escreveu este poema, no chamado 'período de crise' da sua criação literária. Aqui fica o registo do resultado das suas reflexões, num tempo em que não é só a criação literária que está em causa, mas que necessita do mesmo tipo de afirmações.
Como diria uma vizinha.... 'bora lá???

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

o que uma Fada e uma Borboleta tiram De Dentro Para Fora de mim






Esfrego as mãos de contentamento.

O momento aproxima-se.

Relaxo cada músculo do meu corpo, entoando os cânticos dos monges budistas que me permitem alcançar o momento Zen.



OOOOOOOHHHHHHHMMMMMMM

OOOOOOOHHHHHHHMMMMMMM

OOOOOOOHHHHHHHMMMMMMM

Os lençóis estão bem esticados, convidando à posição horizontal, naquela maciez de seda.

Almofada ergonómica, para repousar a cabeça, do esforço que vai exercer por dentro.

Aquecimento central ligado, naquela temperatura em que a modorra nos invade.

Fecho os olhos e começo a empreitada.

(Tenho que sonhar 8 sonhos, porque é que não o posso fazer com estilo???)


A divagar, devagar, aparece-me o primeiro:








1 - Quero esta casa







2 - Desde que tenha este mordomo








3- Um meio de transporte assim






4 - Para me levar a sítios destes










5 - Chegar aos 87 anos desta maneira







6 - Gozar uma reforma milionária aqui











7 - Conhecer os meus tetranetos





8 - E, finalmente, morrer a dormir....




Há, por este bairro fora, sonhadores que terão sonhos mais originais.


Siga a rusga com eles, que eu por aqui fico, a sonhar mais um bocado.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

metamorfose


Ondulou o corpo numa contradança instintiva, ajudada pelo vento Norte que a embalou com o seu sibilar durante o aconchego dos meses de retiro. Tocada pelos primeiros raios de sol, era tempo de despir as vestes rígidas de milhares de fios primorosamente entretecidos que a tinham protegido até àquele momento. Num tempo que já lá ia, tinha dado os seus primeiros passos junto às folhas mortas das amoreiras, no meio de sementes regurgitadas por frutos em dissolução, tocando as asperezas das cascas dos pinheiros e perfumando-se com a sua resina. Uma infância pacata e simples, vivida entre o calor que a fazia espraiar-se ao comprido e o frio e a chuva que a deixavam imóvel por debaixo de algum arbusto, no descanso de uma noite bem dormida ou no sobressalto da vigilância e fuga. Sem ter conhecido pai nem mãe que lhe ensinassem o que fazer, soube exactamente como agir quando o seu corpo lhe pediu mais, lhe pediu para assentar e aprender a ser adulta, lhe disse que teria que bordar o seu próprio vestido, da cabeça aos pés, com finíssimas linhas pacientemente cruzadas e recruzadas, a ponto cheio, lhe segredou, por fim, que teria de adormecer e que quando voltasse a acordar, já nada seria igual.
E assim foi.
Do solo que a vira nascer, da árvore que a deixara amadurecer, saía agora, vitoriosa, sacudindo orgulhosamente as asas que a fariam ganhar o céu, delicadas extensões de um corpo tão delgado e leve, feito para percorrer o arco-íris das flores com o seu beijo.
Espreguiçou-se e voou, levando consigo a eternidade efémera de ser Borboleta.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

conversas secretas


Olha lá, ó Vento!
Que tens tu contra mim?
Porque m’ atiras teu lamento,
uivo gemido em frenesim?
Achas-te muito poderoso,
é, um colossal irascível,
só porque, mesmo furioso,
o teu rosto é invisível?
A isso chamo eu traição,
o não ver claramente,
quem nos ergue a mão,
num açoite permanente.
Levantas o chão em fúria,
tão rabugento e rugidor
pra logo vir com a lamúria
de que sopras por amor?
Não, não pode ser!
Apaixonado, meu amigo?
Eu vou lá poder crer,
que precisamente contigo
isso possa acontecer!!
Mas que paixão funesta
te dará a motivação
de vergar mato e floresta,
em tom de furacão?
Que telhas e telhados
te impedem de amar
se não são eles os culpados
nem te podem ajudar?
Ora diz-me lá, a ventar,
de quem tu gostas realmente,
mas diz-me devagar,
pra perceber exactamente…
Quem? Tu endoidaste?
Esse nome qu’inda agora
tu me segredaste,
saiu-te pela boca fora,
ou comigo brincaste?
Enamorado pela Lua,
que tão longe foi morar,
e tu, que loucura tua,
achas que lhe vais chegar?
Abranda, amigo Vento,
escusas de te esforçar,
volta a soprar lento,
que não a podes conquistar.
O Sol já a levou, cortês,
num cruzar de raios tal,
que uma filha logo lhe fez
chamada Aurora, a Boreal.
Se queres, então, desabafar
o desgosto de amor imenso
em vez de raiva soprar
eu apelo ao teu bom senso:
chora apenas chuva,
nesse teu lamentar,
e clareia a nuvem turva,
que tão bem te faz chorar!

domingo, 1 de fevereiro de 2009

ponto da situação # 16



Querido Diário,

Esta foi uma semana intensa, com emoções ao rubro, à flor da pele, ao correr da pena.

Confessei-me, coisa que nunca na vida tinha feito - nem a um Padre - abri o pantone da minha alma e inaugurei a rádio oficial do Blogobairro.

Descobri coincidências, semelhanças, preocupações comuns, que me deixam pasmada e me aprofundam empatias. Se o mundo é pequeno, este pátio ainda o é mais, com a vontade que temos, de, todos os dias, cumprimentarmos os vizinhos, entrando-lhes pelas casas adentro sem precisar de bater à porta.

Trocam-se chávenas de açúcar em palavras escolhidas a dedo, aquece-se o chá com o calor de conversas em torno de um tema, distribuem-se raminhos de ervas aromáticas a perfumar o caminho até outra casa, apuram-se humores em gargalhadas que se soltam assim mesmo cruas ou refogadas num molho substancial e generoso que se partilha com vontade.

E distribuem-se prendas, mimos, prémios, porque há uma razão para isso, ou simplesmente porque sim.
Foi mais uma das coisas que esta semana teve, a condizer com a que cai do céu há tantos dias: uma chuva de prémios, atribuídos pela Blue Velvet.

Foram estes todos que seguem na lista abaixo, atribuídos por razões tão diversas que nem as consigo enumerar, tanto foi o esforço que fiz só para os trazer para casa. Aliás, a mim, o significado específico de cada um não é o mais importante. Basta apenas e só o gesto, a lembrança e o comentário que lhe vem agregado.



E agora, com licença, que ainda vou acabar de descarregar o camião TIR que tive de alugar para o transporte e tenho muitas buchas e camarões para distibuir pelas minhas paredes, sim??
Até logo!