Romeu e Julieta viviam nuns anexos T1, junto à estação do comboio de Modivas. Ao fim de 6 anos de namoro, e outros tantos de altercações com os pais de cada um, deixaram tudo para trás e, com a conivência de uma tia de ambos, que lhes ficou de avalista, alugaram a primeira casa da sua vida a dois. Primeira, porque não iam ficar ali. Era só para o começo de vida, enquanto ele não era promovido na estação de correios e ela passava de caixa do supermercado para a contabilidade, como o Sr. Rocha lhe tinha prometido. Depois, iriam para um T2, ou um T3 de verdade, ou até uma vivenda, se lhes saísse o Totobola, diziam eles a brincar. Filhos, seria para pensar daí a uns tempos, e só se tivessem a certeza de que não iria haver problema com os meninos, pelo facto de os pais serem primos direitos. Mas queriam muito tê-los, ó se queriam, que haviam de ser lindos, morenos como o pai, de olhos azuis como a mãe, saudáveis e risonhos, bem educadinhos e estudiosos. Seria por eles e por aquele amor todo que os unia, que fariam todos os sacrifícios possíveis e imaginários, que chegariam tarde e más horas do trabalho, depois de umas boas horas extra, pagas a duplicar, que lavariam e passariam, que cozinhariam e arrumariam, dia após dia, noite após noite, mesmo que de noite não repousassem por causa de algum incómodo com as crianças.
Com este sonho sempre em mente, aforraram tudo o que podiam, vivendo com simplicidade e frugalidade, mesmo depois de ele já ser chefe de estação e ela, que não gostou nada que o Sr. Rocha tivesse quebrado a promessa e pusesse lá na contabilidade do supermercado, uma ranhosa, afilhada dele, fosse, agora, dona e senhora da sua própria loja, bem mais fornecida e luminosa do que a do seu antigo patrão.
Os filhos foram chegando, primeiro um rapaz, para fazer a vontade ao pai, depois uma menina, para fazer a vontade à mãe e finalmente outra menina, que fez a vontade aos dois, pois agora tanto lhes fazia, ser menino ou menina, desde que fosse perfeitinho. Todos morenos e de olhos azuis. Todos educadíssimos e excelentes alunos, ali mesmo, nas escolas da freguesia. O orgulho e a felicidade dos pais, que só mudaram de casa para um T3, comprado a pronto, quando nasceu a segunda menina, porque agora ele já era um rapazola e não ficava bem dormir com as manas.
Chegados à hora da reforma, tinham um bom pé de meia no banco. Já formados, em universidades públicas e ali mesmo ao pé de casa, os filhos estavam já prontos a seguir os seus rumos, a namorar e prestes a casar, com gente de bem, de boas famílias, também educados com sacrifícios pelos seus próprios pais. As bodas foram todas simples, como os filhos quiseram e pediram, sem estourar dinheiro em modas ou excessos estapafúrdios e todos preferiram passar os respectivos dias de lua de mel nas praias da Póvoa, onde brincavam desde miúdos.
Agora, já velhinhos, disputados pelos filhos, que os obrigam a passar o fim de semana em casa de cada um e os levam sempre de férias, mimados pelos netos, que os visitam todos os dias, cuidados pela Dna. Rosa, que também todos os dias lhes areja a casa e faz as camas e a comida, Romeu e Julieta decidiram vender o T3 e alugar um T0. São felizes e não sentem necessidade de mais nada.
É que às vezes só é mesmo preciso um grande amor e uma cabana.
9 comentários:
E eu que julgava que Romeu e Julieta era o nome de uma canção da Romana...
Assim escrito até parece verdade, não é?
E fácil. Infelizmente mesmo quando o amor é muito eu não acredito que sobreviva numa cabana.
Mas quem sou eu para dar outro final à sua história???
Beijinhos de mim para Si
Si,
A TRETA mais importante que aqui li, foi a continuação do carinho e amor dos filhos e netos por Romeu e Julieta, visitando-os diariamente levando-os de férias.
Isto já quase não se vê!...
Tretices aconcegadas para Si.
http://tretas-da-vida.blogs.sapo.pt/
Velvet e Tretoso,
A história não é verdadeira, mas poderia ser, porque, felizmente, conheço alguns exemplos.
O que eu quis aqui destacar é que há vidas que se constroem em cima de projectos muito definidos, objectivos muito concretos, que exigem sacrifícios da parte de quem os traça e que servem de grande exemplo às novas gerações. Uns seguem esses princípios, outros não. Mas, nem sempre as histórias acabam mal, não é?
Nem sempre acabam mal. Também conheço um ou outro caso assim, mas são tão raros que já ninguém se lembra deles e a tendência é esquecê-los. Mas felizmente existem.
Quem me dera acabar assim, ainda me falta um, não sei se menino ou menina, sei apenas que não será de olhos claros mas sim de pele escura, espero merecê-lo/a...
Adoro finais felizes
Boa noite, Si.
O sono faz-me adiar a leitura deste post, mas já deixei pronta a sair a resposta ao desafio que me deixou, do Prémio Dardos.
Um beijinho.
Nem sempre querer é poder...infelizmente.
Mas ainda bem que há histórias reais com finais felizes como este; sei que há.
Devem ser amigos da minha Priscila Vanessa e do seu amado Joca.
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